Alteridade
Já faz um
tempo que me sinto instigada a escrever história. História de quando me
descobri gente, negra, mulher. História de quando me encontrei com o lado ruim
de tudo isso, pra descobrir que pra tudo de mal nesse mundo existe o bem em
oposição e que lutando por esse lado a vida vale de ser vivida. E foi assim que
descobri certas particularidades de ser parte, de ser gente. Alteridade.
Foi quando me
encontrei com os medos fóbicos da humanidade que deixei de ver opressores e
passei a enxergar coitados, que tem medo de gente que pensa, gente que fala,
gente que não concorda mas que não fica de mal por causa disso, gente que é
certas coisas que nem se escolhe, mas que nem por isso deixa de dar orgulho, gente
que não é rica, gente que é negra, gente
que é mulher, gente que é gorda. Coitados como vivem aprisionados? Como sofrem
com o pânico de virar a esquina e se deparar com gente diferente do que passa
na TV... como sofrem com o pânico de virar uma esquina e se deparar com eles
mesmos. Como temem ver gente que usa a lente da câmera como janela e não como
espelho. Gente que acorda de mau humor, que não dá indireta, que não vê no
outro um inimigo, e sim um irmão. Gente de sororidade. Gente que não acha certo
viver a serviço alguém só por que esse alguém nasceu diferente, nasceu rico,
nasceu branco, nasceu homem. Pobres crianças alienadas!
Imagine como é
viver num mundo de medo. Um mundo de tristeza disfarçada com foto no espelho e
frase de felicidade exacerbada. Tudo de mais sobra, e onde mora a gargalhada
forçada mora o impulso do suicídio. Gente que vive num mundo de regras, gente
que acha bonito mandar na vida dos outros. Gente que acha que comentar o
assunto dos outros só não é fofoca quando o outro é o outro e não ele mesmo. Gente
rude. Gente que berra. Gente que não sabe admitir que está errado, que não viu,
que não certificou, que não estudou. Gente que não sabe dizer sim. Que não sabe
lidar com o que não dar certo.

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