Guerra de Clichês

Palavras ou expressões que de tanto serem utilizadas, se tornam previsíveis ou se afastam do verdadeiro sentido.
Eu que nasci essencialmente diferente de muita gente, mas não exclusiva ou única o suficiente, sempre tive pânico dos clichês.
Não só das expressões, mas de um estilo de vida previsível, comum, relacionamentos convencionais,  sentimentos ocos, estardalhaço, e histeria coletiva.
Rejeitei tudo, e criei regras. Fiz promessas a mim mesmo e outros acordos menos importantes com meu futuro. Coisas que não faria, pessoas com quem não me relacionaria, lugares onde jamais iria, sotaques que não suportaria. Eu delimitei tudo quanto pude.
Qualquer coisa para não ser clichê.
Porém, a vida que tem por dom a graça, por vezes até a falta dela, tratou de providenciar que esse ano eu tivesse o encontro íntimo com esses tão temidos, e parece que, inclusive, com todos eles.
E tive alguns embates com esses tais, para os quais perdi, todas as vezes.

"O tempo cura tudo"

No momento da dor isso além de não ser consolador, não muda nada, por que não parece que vai passar, mas "tudo passa". As coisas boas e as ruins, acabam passando, mas algumas promovem uma cura que no momento você não percebia que era ferida e que precisava fechar. E por incrível que pareça, passou.

"Há males que vem para o bem"

 Sim, algumas dores são excruciantes. A dor de ser desapontado, de desapontar alguém de falhar, de ser abandonado, ou de descobrir que nunca foi amado por alguém a quem você dedicou tudo, seja essa pessoa quem for, sempre será dilacerante, porém, o resultado da cura do tempo, vai trazer uma alegria incontestável, que encontrará uma pessoa mais calma, madura e consciente, que se não fosse por sofrer determinados males, não usufruiria com tamanho apreço e liberdade.

“E de repente a vida te vira do avesso, e você descobre que o avesso, é o seu lado certo.”
- Caio Fernando Abreu.

Sim, Caio, perdão mas sempre achei isso muito clichê. Mas foi exatamente o que aconteceu comigo, é o que está acontecendo diariamente, tudo que construí como necessário e essencial tudo o que pensei como sendo a minha estrutura como pessoa, se revelou dispensável e até mesmo inadequado. Além dos meus princípios quase nada me veste, e 'o passado é uma roupa que não me cabe mais.'

E por fim, mas não menos importante, o clichê absoluto foi minha fatalidade: o amor.
Não é só uma questão de se apaixonar e amar alguém, já fiz isso muitas vezes, mas é muito além disso.

É uma questão de ter jurado pra mim mesma, que nunca, nunca ia deixar que ninguém se tornasse mais importante do que um ser humano deve ser, e me ver numa atmosfera de alguém, como se respirasse o bem estar dessa pessoa. É o fato de o tempo não fazer a menor diferença, não importa quando começou, importa que exista, que aconteça, e não ter medo de acabar amanhã, pois amanhã ninguém sabe se vive. A imensa liberdade de não se sentir pressionada a abrir mão de nada, e também não precisar escolher. A suavidade do transcorrer dos dias, das pressões nunca atingirem o fundo de você, por que é tudo calmaria, de mesmo com dor ou qualquer mal estar, sentir uma sorte enorme de existir. É não sentir mais vontade de morrer, de fugir, de sumir, pelo contrário é um medo intenso de qualquer coisa me acontecer. É pela primeira vez, vontade, desejo intenso de estar viva. É estar viva. É de entender pra que eu existo, não como ser humano, sei para que os seres humanos existem, mas por que eu, por que após tantos anos ruins eu nunca parti. É sentir o próprio coração no peito, e o corpo funcionando, há uma incrível unidade entre meus membros, como se fosse um funcionamento cíclico, uma máquina complexa e tão leve que posso acabar levitando da cama a qualquer momento. É chorar e sorrir ao mesmo tempo de felicidade, êxtase, saudade, medo e se sentir realizada depois desse misto de emoções como se tivesse acabado de tomar uma decisão importante, é definitivamente ter a sensação de estar sonhando e se surpreender como tudo isso parece real, e como seria bom se fosse e no final, ser. É também ter dito pra si mesma sempre que nunca pensaria em cogitar ter filhos, mas um dia se pegar a vontade com a possibilidade de ver a pessoa amada replicada e crescendo, mesmo que só tenha acontecido uma vez. É estar assustada, apavorada e não conseguir parar de sorrir. É se sentir capaz de realizar qualquer coisa e estar em qualquer lugar, mas limitar sua ambição a abraços, bancos e dividir comida. É ter a voz de uma pessoa como o som preferido no mundo, e todos os outros fossem desnecessários. Mas não por que eu amo, mas por que sou amada. E é sobre como isso fez tudo ficar irrelevante, a idade, o corpo, o gosto das coisas, a mesquinharia das pessoas, os best-sellers e sucessos de bilheteria não me incomodam mais, posso gostar livremente de todos. Posso chorar com dramas, ou com comédias, não importa. Posso ser chamada de bebê, e chamar alguém assim sem sentir que está sendo ridícula, posso finalmente dizer que adoro chocolate, e brigadeiro não tem mais nenhum problema se todo mundo gosta, se todo mundo vai, não importa. Não importa se eu disse que não gostava, que nunca faria, eu posso repensar tudo isso mil vezes por dia, e mesmo assim não decidir nada, por que eu não preciso. Eu não tenho a obrigação de fazer nada, a não ser me priorizar, por que além de ser o que todo mundo quer, consegue ser exatamente o que você precisa, que eu seja feliz.
E nada mais clichê do que amar tanto alguém e ser tão amado de volta, que tudo é uma coisa só.
No fim das contas sinto que foi exatamente para isso que o tempo me curou daqueles males necessários, e me virou inteiramente ao avesso, para que eu encontrasse você, um reflexo perfeito de tudo que eu ainda vou ser.
A verdade sobre esses dias, é que nada está conseguindo importar mais, do que você, a não ser aquilo que importa mais pra você, eu.
Parece então, que era sobre isso que falavam todas as poesias, todas as canções, todas as histórias, não falavam de ninguém a não ser de nós dois, e de todos os milhões de pessoas que se amam.

Eu não sei se consegui explicar. Por que não acho uma palavra pra o que estou sentindo, não consigo uma imagem, uma música, não consigo sequer escrever. A mais fiel expressão disso tudo, são os nossos sorrisos. E quer coisa mais clichê do que ser feliz?





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